Paula Boturão de Almeida1; Geraldo Vicente de Almeida2; Ralph Cohen2; Joao Antonio Prata Júnior3; Paulo Augusto de Arruda Melo1
DOI: 10.1590/S0004-27492001000200004
RESUMO
Objetivo: Verificar a correlação e a correspondência topográfica entre a espessura da camada de fibras nervosas da retina, medidas pelo polarímetro de varredura a laser GDxTM Scanning Laser System® e o campo visual, medido pelo perímetro automatizado Humphrey® ("white-white") em portadores de glaucoma primário de ângulo aberto. Métodos: Foram investigadas as seguintes correlações: 1- Correlação entre a média da sensibilidade dos quadrantes e do ponto de fixação do campo visual, em decibéis, e a média da espessura da camada de fibras nervosas da retina correspondente, em micra, sem classificação dos olhos dos pacientes quanto ao estadio do comprometimento perimétrico. 2- A mesma correlação anterior, porém, com os olhos dos pacientes distribuídos em classes quanto à alteração perimétrica. 3- Correlação entre os índices globais do campo visual e os índices numéricos do analisador de espessura da camada de fibras nervosas da retina. 4- Correlação entre a média dos valores do gráfico "total deviation" do campo visual e o desvio da normalidade da camada de fibras nervosas da região correspondente. 5- Investigou-se a freqüência de correspondência topográfica entre os defeitos perimétricos e as alterações da camada de fibras nervosas da retina. Utilizou-se o coeficiente de correlação de Spearman, sendo o nível de rejeição para a hipótese de nulidade fixado num valor menor ou igual a 0,05 (5%). Resultados: Observou-se as seguintes correlações estatisticamentes significantes, mas de forma muito pouco intensa: 1- GDX total e Campo visual total; GDX superior e Campo visual nasal inferior; GDX inferior e Campo visual nasal superior; GDX nasal e Campo visual temporal; GDX superior e Campo visual inferior; GDX inferior e Campo visual superior. 2- GDX inferior e Campo visual nasal (medial) superior dos pacientes classificados como graves. 3- Nos olhos classificados como normais: PSD e EM; CPSD e SI.Nos olhos classificados como discretos: SF e SN. Nos olhos classificados como moderados: SF e SI. Nos olhos classificados como graves: MD e SN; MD e EM; MD e S; CPSD e EM. 4- DN t e TD t; DN s e TD ni; DN i e TD ns. 5- Encontramos correspondência positiva (+) em 36 olhos (51,43% dos casos) e correspondência negativa (-) em 34 olhos (48,57% dos casos). Conclusões: Concluiu-se que houve poucas correlações significantes entre esses dois exames, e que as existentes foram muito fracas. Conclui-se, também, que houve correspondência topográfica, na análise dos setores mais comprometidos, em 51,43% dos casos.
Descritores: Glaucoma; Fibras nervosas; Topografia; Retina; Campos visuais
ABSTRACT
Purpose: To determine the relationship between nerve fiber layer thickness detected by scanning laser polarimetry (GDx) and visual field function measured by automated conventional white-on-white perimetry. Methods: 82 eyes of 48 open angle glaucoma patients were studied. The following correlations were inves-tigated: 1- Correlation between mean sensitivity of 4 quadrants plus the fixation point, in dBs, and the mean of the nerve fiber layer thickness of the correspondent retina, in micra. 2- Correlation between mean sensitivity of 4 quadrants plus the fixation point, in dBs, and the mean of the nerve fiber layer thickness of the correspondent retina, in micra, in the patients classified according to the amount of visual field loss. 3- Correlation between the global indices of visual field and the numeric indices of GDx. 4- Correlation between the mean of "total deviation" of visual field and the "deviation from normal" of GDx. 5- Topographic match between visual field and retinal nerve fiber layer thickness changes. Statistical analysis was performed using the Spearmann coeficient correlation test. Results: We observed a very poor correlation regarding: 1- total GDx and VF total; superior GDx and nasal inferior VF; inferior GDx and nasal superior VF; nasal GDx and temporal VF; superior GDx and inferior VF; inferior GDx and superior VF. 2- inferior GDx and nasal superior VF (severe eyes). 3- Normal eyes: PSD and EM; CPSD and SI. Mild glaucoma eyes: SF and SN. Severe glaucoma eyes: MD and SN; MD and EM; MD and S; CPSD and EM. 4- DN t and TD t; DN s and TD ni; DN i and TD ns. 5- A positive topographic match in 51.43%. Conclusion: There is no good correlation between the two examinations.
Keywords: Glaucoma; Nerve fibers; Topography; Retina; Visual fields
INTRODUÇÃO
O GDxTM Glaucoma Scanning System® (Laser Diagnostic Technologies, Inc., San Diego, CA) é um dos equipamentos que analisa a espessura da camada de fibras nervosas da retina através da polarimetria.
Estudos mostram que a reprodutibilidade do exame é satisfatória(1). Alguns trabalhos referem altos índices de sensibilidade e especificidade desse equipamento(2).
Todos os pontos da retina deveriam apresentar correspondência no campo visual.
Os defeitos anatômicos e funcionais no glaucoma têm sido estudados com várias técnicas de exame, sendo a correlação entre eles motivo de estudos com resultados conflitantes(3-5).
Esse estudo teve como objetivo verificar a correlação e correspondência topográfica entre a espessura da camada de fibras nervosas da retina, medidas pelo polarímetro de varredura a laser GDxTM Scanning Laser®, e o campo visual, avaliado pelo perímetro automatizado Humphrey® ("white-white"), em pacientes portadores de glaucoma primário de ângulo aberto.
MÉTODOS
Pacientes
Foram avaliados 82 olhos de 48 pacientes com diagnóstico de glaucoma primário de ângulo primário (GPAA). Doze olhos não apresentavam defeito perimétrico característico de glaucoma, setenta sim. Foram excluídos do estudo 14 olhos, por possuírem acuidade visual incompatível com a realização do exame de campo visual ou apresentarem o exame do GDx com qualidade comprometida. Todos eles pertenciam ao Ambulatório do Setor de Glaucoma do Departamento de Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Vinte e um deles eram do sexo masculino e 27 do sexo feminino. Vinte e um pacientes eram brancos, 24 pretos e 3 amarelos.
As idades dos pacientes variaram de 22 a 90 anos, com média de 60 anos completos. Dos 82 olhos, 39 eram olhos direitos e 43 olhos esquerdos.
O trabalho foi aprovado pela Comissão de Ética Médica do Hospital São Paulo da Universidade Federal de São Paulo e todos os pacientes asssinaram termo de consentimento.
Os critérios para inclusão de pacientes foram os seguintes: Ser portador de GPAA com hipertensão ocular e alteração característica de disco óptico, possuir os meios transparentes oculares normais, apresentar exame de campo visual confiável (perda de fixação, falso positivo e falso negativo < 30%) e reprodutível (pelo menos dois exames com índices globais semelhantes).
Os critérios para exclusão de pacientes foram os seguintes: Possuir outra doença ocular, ter antecedente de cirurgia ocular e/ou procedimento a laser, apresentar alteração cório-retínica detectável oftalmoscopicamente, possuir ametropia >4 dioptrias, diâmetro pupilar < 2mm, história de traumatismo ocular prévio, história de uso prévio de corticosteróides, tópico ou sistêmico.
Perimetria
Utilizou-se o perímetro automatizado Humphrey® (Humphrey Instruments Inc., EUA), "white-white" (iluminação de fundo e estímulos de cor branca), modelo 630, estratégia "Full Threshold" e programa 30-2 ou 24-2.
Foram determinados os seguintes parâmetros:
1 - Média da sensibilidade, em decibéis, do campo visual total (CV t).
2 - Média da sensibilidade, em decibéis, do campo visual superior e inferior (CVs e CVi).
3 - Média da sensibilidade, em decibéis, do hemicampo temporal (CV te).
4 - Média da sensibilidade, em decibéis, dos quadrantes nasais superior e inferior do campo visual (CV ns e CV ni).
5 - Limiar foveal, em decibéis (LF).
6 - Índices globais dos campos visuais:"mean deviation" (MD), "pattern standard deviation" (PSD), "short-term fluctuation" (SF), "corrected pattern standard deviation" (CPSD).
7 - Média dos valores de cada um dos quadrantes do campo visual apresentados no gráfico "total deviation": "total deviation" total (TD t), "total deviation" nasal superior (TD ns), "total deviation" nasal inferior (TD ni) e "total deviation" temporal (TD te).
8 - Identificação, através dos valores obtidos no gráfico "total deviation", do quadrante mais afetado, ou seja, com maior desvio da normalidade.
9 - Distribuição dos campos visuais em quatro classes, segundo o estadio de evolução do defeito perimétrico, seguindo a adaptação de Sponsel(6) da classificação de Hodapp, Parrish, Anderson.
Análise da Camada de Fibras Nervosas da Retina
A análise da camada de fibras nervosas da retina foi realizada utilizando polarímetro de varredura a laser GDxTM Glaucoma Scanning System® (Laser Diagnostic Technologies, Inc., San Diego, CA), cujo modelo contém o pacote de análise estatística versão 1,0.
Foram obtidas três imagens e realizada uma imagem média para análise, após ajuste de foco e brilho, e centralização do disco óptico.
A margem do disco óptico foi marcada com um círculo ou elipse e a espessura da camada de fibras nervosas da retina foi determinada a distância de 1,75 diâmetros papilares para cada quadrante da região peripapilar: superior (120 graus), inferior (120 graus), nasal (70 graus) e temporal (50 graus).
O exame foi realizado com a luz da sala acesa, sem midríase medicamentosa e sem interrupção do uso de drogas hipotensoras oculares.
As medidas foram realizadas sempre pelo mesmo observador, que não conhecia os dados clínicos e perimétricos do paciente, mas estava ciente do diagnóstico.
Foram determinados os seguintes parâmetros:
1 - Média da espessura da camada de fibras nervosas, em micra, da retina total (GDXt).
2 - Média da espessura da camada de fibras nervosas da retina, em micra, nas seguintes regiões: superior (GDX s), temporal (GDX te), inferior (GDX i) e nasal (GDX n).
3 - Índices numéricos fornecidos pelo analisador de espessura da camada de fibras nervosas da retina: "symmetry" (SYM), "superior ratio" (SR), "inferior ratio" (IR), "superior/nasal" (SN), "max. modulation" (M), "ellipse modulation" (EM), "number" (N), "average thickness" (AT), "ellipse average" (EA), "superior average" (SA), "inferior average" (IA), "superior integral" (SI).
4 - Identificação da região com maior alteração da camada de fibras nervosas da retina, definindo-se como a região mais afetada, aquela com maior desvio do normal, isto é, com o menor valor no gráfico "deviation from normal".
5 - Desvio da normalidade ("deviation from normal") total (DN t), superior (DN s), inferior (DN i) e nasal (DN n).
A figura 1 mostra o esquema da distribuição das fibras nervosas da retina (Hogan, Alvarado, Weddel, 1971)(7) com o esquema do GDx sobreposto.
Correlações e Correspondência Topográfica
A - Correlações
Foram investigadas as seguintes correlações:
1 - Correlação entre a média da sensibilidade dos quadrantes e do ponto de fixação do campo visual, em decibéis, e a média da espessura da camada de fibras nervosas da retina correspondente (Anderson, 1982)(8), em micra, sem classificação dos pacientes quanto ao estádio do comprometimento perimétrico. Assim:
- CV total X GDX total
- CV nasal inferior X GDX superior
- Limiar foveal X GDX temporal
- CV nasal superior X GDX inferior
- CV temporal X GDX nasal
Investigou-se ainda uma possível correlação entre:
- CV superior X GDX inferior
- CV inferior X GDX superior
2 - As mesmas correlações anteriores, porém, com os pacientes distribuídos em classes quanto à alteração perimétrica.
3 - Correlação entre os índices globais do campo visual e os índices numéricos do analisador de espessura da camada de fibras nervosas da retina.
4 - Correlação entre a média dos valores do total deviation e o desvio da normalidade da camada de fibras nervosas da região correspondente.
B- Correspondência Topográfica
1- Nos olhos com defeitos perimétricos, 70 olhos, foi determinado o quadrante mais afetado, utilizando-se o gráfico "total deviation" do campo visual, e verificada a freqüência de correspondência topográfica com a região mais afetada, isto é, com o menor valor no gráfico "deviation from normal", do GDX. Considerou-se correspondência positiva (+) quando as áreas mais afetadas dos dois exames apresentaram correspondência de localização (segundo Anderson), e negativa (-) quando isso não ocorreu.
Método Estatístico
Para estudar possíveis correlações entre as alterações perimétricas e as alterações da camada de fibras nervosas da retina nos pacientes portadores de GPAA, foi utilizado o Coeficiente de Correlação de Spearman.
O nível de rejeição para a hipótese de nulidade foi fixado num valor menor ou igual a 0,05 (5%).
RESULTADOS
1 - Resultados da primeira correlação:
Os resultados da correlação entre a média da sensibilidade de cada um dos quadrantes e do ponto de fixação do campo visual, em decibéis, e a média da espessura da camada de fibras nervosas da retina correspondente, em micra, sem classificação dos pacientes por estadio da doença, apresentaram os seguintes resultados estatisticamente significantes (como apresentados na tabela 1a):
GDX total e CV total r = +0,34 GDX superior e CV nasal inferior r = +0,34 GDX inferior e CV nasal superior r = +0,45 GDX nasal e CV temporal r = +0,22
A correlação entre GDX temporal e o limiar foveal não foi estatisticamente significante.
Os resultados da correlação entre a média da sensibilidade do campo visual superior e inferior, em decibéis, e a média da espessura da camada de fibras nervosas da retina inferior e superior, em micra, sem classificação dos pacientes por estádio da doença, apresentaram os seguintes resultados (como apresentados na tabela 1b):
GDX superior e CV inferior r = +0,39
GDX inferior e CV superior r = +0,45
2 - Resultados da segunda correlação:
Os resultados da correlação entre a média da sensibilidade de cada um dos quadrantes e do ponto de fixação do campo visual, em decibéis, e a média da espessura da camada de fibras nervosas da retina correspondente, em micra, com os pacientes distribuídos em classes quanto à alteração perimétrica, apresentaram os seguintes resultados estatisticamente significantes (como estão relacionados na tabela 2):
GDX inferior e CV nasal superior dos pacientes classificados como severos: r = +0,45
Todas as outras correlações não foram estatisticamente significantes.
3 - Resultados da terceira correlação:
Os resultados da correlação entre os índices globais do campo visual e os índices numéricos do analisador de espessura da camada de fibras nervosas da retina, com os pacientes distribuídos em classes quanto à alteração perimétrica, apresentaram os seguintes resultados estatisticamente significantes (como relacionados nas tabelas 3, 4, 5 e 6, respectivamente):
- olhos classificados como normais:
PSD e EM r = -0,62 CPSD e SI r = +0,64 - olhos classificados como discretos:
SF e SN r = -0,56
- olhos classificados como moderados:
SF e SI r = +0,43
- olhos classificados como severos:
MD e SN r = +0,38 MD e SI r = + 0,43 MD e EM r = +0,39 CPSD e EM r = +0,40
Todas as outras correlações não foram estatisticamente significantes.
4 - Resultados da quarta correlação:
Os resultados da correlação entre a média dos valores do "total deviation" e o desvio da normalidade da camada de fibras nervosas da região correspondente, apresentaram os seguintes resultados estatisticamente significantes (como relacionados na tabela 7):
DNt e TDt r = +0,338 DNs e TDni r = +0,454 DNi e TDns r = +0,444
A correlação entre DN nasal e TD temporal não foi estatisticamente significante.
5 - Resultados da correspondência topográfica:
Os resultados da correspondência topográfica entre o defeito perimétrico e o defeito de espessura da camada de fibras nervosas da retina apresentaram os seguintes resultados (como relacionados na tabela 8):
Correspondência positiva (+) em 36 olhos (51,43% dos casos).
Correspondência negativa (-) em 34 olhos (48,57% dos casos).
COMENTÁRIOS
No presente estudo, a correlação entre média da sensibilidade, em decibéis, dos quadrantes do campo visual e a média da espessura da camada de fibras nervosas da retina correspondente, em micra, mostrou-se estatisticamente significante em apenas algumas análises. Apesar de existir, essa correlação apareceu de forma muito pouco intensa, visto que o coeficiente de determinação (r2) é pequeno em todas as análises.
Quando investigamos a correlação entre os índices globais do campo visual e os índices numéricos do analisador de espessura da camada de fibras nervosas, a significância também foi pouco intensa.
Na correlação entre a média dos valores do gráfico "total deviation" do CV e o desvio da normalidade da camada de fibras nervosas da região correspondente, encontramos também, significância pouco intensa.
No restante das investigações, além de não ter ocorrido correlação significante, os valores mostram discordância nos seus sinais, alguns propondo uma relação direta e outros uma relação inversa.
Quando investigamos a correspondência topográfica entre as alterações perimétricas e as alterações da camada de fibras nervosas da retina, encontramos correspondência positiva (+), isto é, a área mais afetada do campo visual correspondia à área mais afetada do GDx, em apenas 36 olhos (51,43% dos casos).Sendo que em 34 olhos, 48,57% dos casos, essa correspondência não ocorreu.
Os poucos trabalhos existentes na literatura que correlacionam espessura da camada de fibras nervosas da retina, medida pelo GDx, e defeitos perimétricos, analisados pelo perímetro automatizado Humphrey, em portadores de GPAA, comparam hemicampos com hemi-retinas(9-10). Em nossso trabalho consideramos a topografia das fibras nervosas na região próxima ao disco óptico e os setores do campo visual a eles correspondentes, o que nos parece imprescindível para a tentativa de avaliação da possível correlação entre anatomia e função.
Os motivos dessa variabilidade e da pouca intensidade da correlação não estão claros. Existem vários fatos que podem, em maior ou menor intensidade, ter contribuído para esses resultados.
Quigley, Dunkelberger, Green, em 1989(11), estudaram a relação entre a perda de sensibilidade do campo visual e a porcentagem de células ganglionares normais existentes. Chegaram a conclusão de que, para uma perda de 5 decibéis, ocorre a morte de 20 a 50% de células ganglionares. Mas relatam que em algumas áreas com 0 decibel de sensibilidade, havia ainda 3 a 36% de células ganglionares. Nesse mesmo trabalho, os autores observam que o dano glaucomatoso ocorre de forma seletiva, ocorrendo uma maior perda das magnocélulas. Esses dados sugerem que a relação entre a estrutura e a função das fibras nervosas da retina não esteja ainda totalmente esclarecida. Sugerem que, apesar de estarem fisicamente presentes na retina, algumas fibras nervosas podem estar, em termos de sensibilidade retínica, com função ausente. Por outro lado, muitas fibras podem ter sido lesadas sem causar qualquer alteração de sensibilidade no campo visual, fazendo com que a correlação entre esses dois exames fique comprometida.
Glovinsky, Quigley, Dunkelberg, em 1991(12), confirmaram a existência de dois tipos de células ganglionares retínicas: pequenas e grandes. Observam que ainda permanece a controvérsia sobre qual é o tipo lesado no glaucoma. Sugerem que os axônios das grandes células ganglionares sejam os primeiros a serem lesados. Recomendam o uso de testes propedêuticos que pesquisem a função dessas células para detectar e acompanhar o glaucoma em fase inicial. E para acompanhar os casos de glaucoma avançado, testes que avaliem a função das pequenas células.
Talvez a perda seletiva interfira nos resultados desses dois exames e na correlação entre eles. Havendo a possibilidade da perimetria white-white, realizada com o perímetro computadorizado Humphrey, não conseguir detectar as pequenas variações de função das células ganglionares da retina.
Podemos levantar alguns outros fatos que podem ter comprometido a correlação entre esses dois aparelhos.
A quantidade de fibras nervosas necessária para causar determinada perda de sensibilidade no campo visual pode variar individualmente. Existe grande variação no número de fibras nervosas no nervo óptico normal, de 700.000 à 1.500.000.
Outra possibilidade seria que, a distribuição das fibras nervosas não se dê de forma tão regular como na teoria, havendo mudança de localização de algumas fibras. Apesar disso, parece-nos pouco provável que esse fato tenha contribuído para os resultados encontrados, pois essa mudança de trajeto poderia ocorrer com poucas fibras, não chegando a interferir no conjunto.
Outro ponto a salientar é o fato do programa GDx solicitar a especificação da raça do examinado, isto em nosso País, pela miscigenação de raças, pode ter influenciado nos nossos resultados.
Todos esses fatos podem, em maior ou menor grau, ter contribuído para que a correlação entre as alterações anatômicas, detectadas pelo analisador da camada de fibras nervosas da retina GDX, e as funcionais, detectadas pelo perímetro automatizado Humphrey tenha ocorrido somente em um pequeno número de pacientes.
Apesar de não ter havido correlação entre os dados desse novo aparelho e os fornecidos pelo clássico perímetro automatizado, achamos que essa nova técnica pode vir a ser importante no estudo do glaucoma, mas que necessita de maior investigação científica da sua importância clínica no diagnóstico dessa doença.
A Academia Americana de Oftalmologia, em 1999(13), publicou um estudo realizado pelo Ophthalmic Procedure Preliminary Assessment (OPPA), que tinha como objetivo avaliar a nova tecnologia utilizada para a propedêutica do glaucoma. Eles concluem que nenhum dos novos analisadores de imagem (Rodenstock Optic Nerve Head Analyzer, Heidelberg Retina Tomograph, Scanning laser Polarimetry, Optical Coherence Tomography) são suficientes para a realização do diagnóstico do glaucoma. Podem ser importante na monitorização da progressão do dano glaucomatoso. Salientam a necessidade de estudos longitudinais para certificar a aplicabilidade desses novos equipamentos.
Mills, em 1999(14), acredita que essa nova tecnologia é complementar à propedêutica já utilizada no glaucoma, examinando a doença por uma perspectiva diferente do campo visual, não sendo esses dois exames necessariamente correlacionáveis. Acredita, também, que muitos estudos ainda são necessários para a validação desses novos equipamentos, mas que eles realmente já possuem o seu espaço na propedêutica do glaucoma.
Esse parece-nos ser mais um método para incrementar o arsenal propedêutico do glaucoma, não sendo capaz de substituir os já existentes. E que ainda está longe de ser a solução de todos o casos que geram dúvida diagnóstica na prática oftalmológica.
AGRADECIMENTOS
Prof. Dr. Carlos Ramos de Souza Dias
Prof. Dr. Elias Rodrigues de Paiva
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Estudo realizado no Setor de Glaucoma da Universidade Federal de São Paulo ¾ Escola Paulista de Medicina (UNIFESP ¾ EPM).
1 Pós-graduanda em Oftalmologia, nível doutorado, da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina.
2 Professor Adjunto-Doutor do Departamento de Oftalmologia da Faculdade Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
3 Professor Adjunto-Doutor do Departamento de Oftalmologia da Faculdade Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.
4 Chefe do Setor de Glaucoma do Departamento de Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina.
5 Professor Adjunto, orientador do Curso de Pós-graduação, Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina.
Endereço para correspondência: Av. Pacaembú, 1358 - São Paulo (SP) CEP 01234-000.