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Editorial

Laser de diodo no tratamento da retinopatia da prematuridade

Diode laser in the treatment of retinopathy of prematurity

Josilene de Carvalho Soares Liarth1; João Orlando Ribeiro Gonçalves1; Ednaldo Atem Gonçalves2; Eridê Sousa Meneses1; Fábio Martins Soares1

DOI: 10.1590/S0004-27492001000500008

RESUMO

Objetivo: Determinar a eficácia do laser de diodo e suas complicações no tratamento da retinopatia da prematuridade, estágio 3 limiar. Métodos: De 348 crianças pré-termo examinadas na Clínica Oftalmológica do Hospital Getúlio Vargas e Instituto de Olhos do Piauí, em Teresina, Piauí, no período de julho/89 a março/99, 152 (43,7%) apresentaram retinopatia da prematuridade. As crianças com retinopatia da prematuridade no estágio 3 limiar foram submetidas a laserablação retiniana com laser de diodo indireto, no centro cirúrgico, sob anestesia geral. Resultados: Vinte crianças (38 olhos) foram submetidas a laserablação retiniana. Doze pacientes (80,0%) tiveram regressão da retinopatia e três (20,0%) evoluíram para o estágio 5. Cinco crianças não retornaram para controle, sendo excluídas do estudo quanto aos resultados do laser. Não foram observadas complicações oculares. Cinco crianças apresentaram apnéia relacionada à anestesia. Conclusões: Neste grupo de crianças, o laser de diodo foi eficaz em 80,0% dos pacientes tratados. As complicações encontradas (cinco casos de apnéia) se relacionaram possivelmente à anestesia geral.

Descritores: Retinopatia da prematuridade; Fotocoagulação; Lasers; Recém-nascido; Prematuro

ABSTRACT

Purpose: To determine the efficacy of the diode laser and its complications in treating retinopathy of prematurity, at stage 3, threshold. Methods: One hundred and fifty-two children, out of 348 premature infants examined at the Ophthalmologic Clinic of the Getúlio Vargas Hospital and Instituto de Olhos do Piauí, in Teresina - Piauí, from July '89 to March '99, had retinopathy of prematurity. Those with retinopathy of prematurity at stage 3, threshold, were submitted to application of diode indirect laser to the retina. Results: Twenty children (38 eyes) received diode laser. Twelve patients showed regression of retinopathy and three children developed stage 5. No ocular complications were observed. Five children had respiratory failure due to anesthesia. Conclusions: The diode laser treatment was successful in 80.0% of the patients. The complications were possibly related to the general anesthesia.

Keywords: Retinopathy of prematurity; Light coagulation; Lasers; Infant, newborn; Infant, premature

INTRODUÇÃO

A retinopatia da prematuridade (R.P.) é uma doença vasoproliferativa que acomete a retina de crianças prematuras, principalmente as com peso de nascimento menor que 1250 gramas e com idade gestacional (IG) menor que 31 semanas, sendo causa importante de cegueira na infância.

A classificação internacional da R.P.(1-2) descreve cinco estágios da doença: estágio 1 - linha de demarcação; estágio 2 - crista retiniana; estágio 3 - crista retiniana com proliferação fibrovascular extra-retiniana; estágio 4 - descolamento da retina, A- extrafoveal e B-incluindo a fóvea; e estágio 5 - descolamento total da retina.

O tratamento da R.P. é feito de acordo com o estágio da doença. Nos estágios 1 e 2, a conduta é expectante. No estágio 3+plus (tortuosidade e ingurgitamento vascular retiniano) na zona 1 ou 2, com extensão de cinco ou mais horas contíguas ou oito horas cumulativas de neovascularização, perfazendo 240o (estágio 3 limiar) há indicação para crioablação ou laserablação retiniana. Nos estágios 4 e 5 estão indicados procedimentos mais agressivos como introflexão escleral, vitrectomia ou outros, conforme a necessidade. O tratamento aplicado, bem como a anestesia para a realização do mesmo, podem levar a complicações oculares e/ou sistêmicas.

Nesse contexto, procurou-se determinar a eficácia do laser de diodo e suas complicações no tratamento da R.P. no estágio 3 limiar.

 

MÉTODOS

Examinaram-se com oftalmoscopia binocular indireta (O.B.I.), 348 crianças prematuras, encaminhadas pelo setor de neonatologia da Maternidade Dona Evangelina Rosa, ao Serviço de Retina e Vítreo da Clínica Oftalmológica do Hospital Getúlio Vargas (H.G.V.) e Instituto de Olhos do Piauí (I.O.P.), em Teresina-Piauí, no período de julho de 1989 a março de 1999.Os critérios utilizados para o exame foram: prematuridade com peso £ 1500g ou IG £32 semanas e prematuridade com peso >1500g ou IG>32 semanas associado a oxigenoterapia, transfusão sanguínea, infecção ou antibioticoterapia. As crianças foram examinadas entre 4 e 6 semanas de vida.

Cento e cinquenta e duas crianças apresentaram R.P. ao primeiro exame, sendo: 5,26% na forma regressiva; 49,34% no estágio 1; 8,55% no estágio 2; 11,18% no estágio 3; 3,29% no estágio 4; 21,05% no estágio 5 e 1,32% na zona 1, muito posterior. Dentre os pacientes nos estágios 1 e 2, oito evoluíram para o estágio 3 da doença.

Submeteram-se as crianças com diagnóstico de R.P. no estágio 3 limiar à laserablação retiniana com laser de diodo (Iris medical - oculight) através de O.B.I., com marcas espaçadas, no centro cirúrgico, após dilatação pupilar com fenilefrina 2,5% e tropicamida 0,5% 3x cada, sob anestesia geral com halotano. Apenas uma criança, foi tratada mais de uma vez, 16 meses após o primeiro procedimento. O tempo médio de observação dos pacientes foi de 12 meses.

 

RESULTADOS

Vinte crianças foram submetidas a laserablação retiniana, no total de 38 olhos, sendo 11 crianças do sexo feminino e nove do sexo masculino (Quadro 1). Uma criança necessitou de laser em apenas um olho e outra teve o procedimento interrompido antes do tratamento do segundo olho.

 

 

O peso ao nascimento variou de 820g a 1470g com peso médio de 1144g; a idade gestacional de 26 a 34 semanas,com idade gestacional média de 30 semanas e a idade gestacional pós-conceptual na época do tratamento de 34 a 46 semanas, com média de 41 semanas.

O número de marcas de laser por olho, foi em média 370, variando de 71 a 1096, algumas crianças tiveram o procedimento suspenso e o tratamento incompleto, devido apnéia.

As complicações gerais que ocorreram foram paradas respiratórias, em cinco crianças (25,0%).Em duas crianças a apnéia ocorreu durante a indução anestésica. As demais crianças apresentaram apnéia durante a laserablação. Algumas apresentaram mais de uma apnéia. Não foram observadas complicações oculares relacionadas ao tratamento com o laser de diodo.

Doze crianças (80,0%) tiveram regressão da retinopatia, e três (20,0%) evoluíram para o estágio 5 (Tabela 2). Cinco crianças não retornaram para controle sendo excluídas do estudo quanto aos resultados do laser. As crianças que evoluiram para descolamento total da retina tinham peso ao nascimento e idade gestacional respectivamente:1100g/27 semanas, 1470g/32 semanas e 1420g/29 semanas.

 

 

DISCUSSÃO

A ablação da retina avascular tem reduzido significativamente a morbidade da R.P., em estágio avançado. Esta ablação foi primeiramente descrita com o xenônio em 1968 (3). Posteriormente o laser de argônio foi usado para tratar a doença. Em 1981, foi introduzido o laser através da oftalmoscopia indireta. As retinopatias que podem ser tratadas com o laser de argônio podem ser tratadas com o laser de diodo. O estudo de Benner et al.(4) comparou a fotocoagulação com o laser de argônio verde, kriptônio vermelho e o laser de diodo através da oftalmoscopia indireta em olhos de coelhos e demonstrou a variação na intensidade e diâmetro da marca com os três tipos de laser.

O laser de diodo na fotocoagulação retiniana, por apresentar comprimento de onda grande (810 nm), pode ser utilizado em casos de opacificação cristaliniana moderada e hemorragia vítrea leve, pois apresenta boa transmissão nesses meios, ao contrário do laser de argônio azul-verde e verde(5). Neste estudo, uma criança com R.P. na zona 1 muito posterior, apresentou dilatação venosa e hemorragia retiniana em um olho, 16 meses após o primeiro procedimento, sendo realizado nova laser ablação retiniana e evoluído bem após o tratamento.

Os resultados iniciais do uso da crioterapia transescleral para tratamento da R.P. em estágios avançados, em 1970, foram desfavoráveis(3). Porém, o seu uso clínico foi aceito após sua utilização no Japão, em 1972(6-7). O estudo multicêntrico de crioterapia para tratamento da R.P.(6) demonstrou que a evolução desfavorável foi significantemente menos freqüente em olhos tratados com a crioterapia transescleral retiniana do que nos olhos não tratados, demonstrando a eficácia do tratamento na redução da progressão da doença para descolamento de retina ou tecido retrocristaliniano.

Vários estudos(8-10) compararam a eficácia da crioterapia com a fotocoagulação com laser na R.P. e concluíram que estas técnicas são equivalentes na eficácia, embora a laserterapia apresente menos complicações per e pós-operatórias. Neste estudo não foi comparado laserablação com crioablação.

No presente trabalho, o laser de diodo foi eficaz em 80,0% dos casos (12 pacientes) - 23 olhos - com regressão completa da retinopatia. No estudo de Moraes et al.(10) todas as crianças tratadas com laser de diodo indireto apresentaram regressão da doença.

O número de marcas de laser por olho, variou de acordo com a necessidade, com uma média de 370 marcas por olho. A criança que necessitou de um maior número de disparos (1096 disparos no olho direito e 1049, no esquerdo) foi um dos casos de R.P. na zona 1 muito posterior. A mesma, apesar do tratamento, evoluiu para o estágio 5.

A primeira das duas crianças com RP estágio 3 limiar na zona 1 muito posterior, evoluiu bem após a laserablação retiniana; porém, 16 meses após o tratamento, apresentou hemorragia retiniana e dilatação venosa em um olho sendo necessária a repetição do laser neste olho, com regressão da doença após o mesmo. A segunda, como citado no parágrafo anterior, apresentou resultado insatisfatório, com evolução para descolamento total da retina. No estudo de Capone et al.(11), em que foi usado o laser de diodo no tratamento da RP estágio 3 limiar na zona 1, 16,7% dos olhos desenvolveram descolamento de retina.

McNamara et al.(12) relacionaram as complicações da fotocoagulação com laser na R.P.: edema corneano, lesão iriana, lesão no cristalino, hemorragias retiniana, pré-retiniana ou vítrea, hemorragia coroidal, neovascularização de coróide, fotocoagulação acidental da fóvea, formação de membrana pré - retiniana e descolamento de retina tardio. Neste trabalho não foram observadas tais complicações oculares. Entretanto, cinco crianças apresentaram apnéia possivelmente relacionada à anestesia e, em algumas delas, o procedimento teve que ser suspenso, em uma inclusive, a complicação ocorreu durante o tratamento do primeiro olho, não tendo sido realizado no segundo olho. Esta criança não retornou para controle.

 

CONCLUSÕES

Neste grupo de crianças, o laser de diodo foi eficaz em 80,0% dos pacientes tratados no estágio 3 limiar da RP. As complicações encontradas (cinco casos de apnéia) se relacionaram possivelmente à anestesia geral.

 

 


 

 

REFERÊNCIAS

1. An international classification of retinopathy of prematurity.Committee for the classification of retinopathy of prematurity. Arch Ophthalmol 1984;102: 1130-4.         

2. An international classification of retinopathy of prematurity. The classification of retinal dettachment The International Committee for the Classification of the Late Stages of Retinopathy of Prematurity. Arch Ophthal 1987;105: 906-12.         

3. Nagata M, Kobayashi Y, Fukuda H, apud Benner JD. Photocoagulation with the laser indirect ophthalmoscope for retinopathy of prematurity. Semin Ophtalmol 1992;7:177-81.         

4. Benner JD, Huang M, Morse LS, Hielmeland LM, Landers MB. Comparison of photocoagulation with the argon, krypton, and diode laser indirect ophthalmoscopes in rabbit eyes. Ophthalmology 1992;99:1544-63.         

5. Gonçalves JCM. Laser de diodo. Arq Bras Oftalmol 1996;59:103-4.         

6. Multicenter trial of cryotherapy for retinopathy of prematurity - preliminary results. Cryotherapy for Retinopathy of Prematurity Cooperative Group. Arch Ophthalmol 1988;106:471-9.         

7. Yamashita Y. Study on retinopathy of prematurity (III). Cryocautery for retinopathy of prematurity. Jpn J Clin Ophthalmol 1972;26:385-93.         

8. Hunter GD, Repka MX. Diode laser photocoagulation for threeshold retinopathy of prematurity. A randomized study. Ophthalmology 1993;100:238-44.         

9. McNamara JA, Tasman W, Brown GC, Federman JL. Laser photocoagulation for stage 3+ retinopathy of prematurity. Ophthalmology 1991;98:576-80.         

10. Moraes NSB, Farah ME, Bonomo PP, Almeida MFB. Laser de diodo versus crioterapia no tratamento da retinopatia da prematuridade: estudo comparativo. Arq Bras Oftalmol 1997;60:635-8.         

11. Capone A, Diaz-Rohena R, Sternberg P, Mandell B, Lambert HM, Lopez PF. Diode-laser photocoagulation for zone 1 threshold retinopathy of prematurity. Am J Ophthalmol 1993;116:440-50.         

12. McNamara JA. Laser treatment for retinopathy of prematurity. Cur Opin Ophthalmol 1993;4:76-80.         

 

 

Serviço de Retina e Vítreo do Hospital Getúlio Vargas; Centro de Ciências da Saúde - Universidade Federal do Piauí; Instituto de Olhos do Piauí - Teresina (PI).

1 Médica oftalmologista do Hospital Getúlio Vargas.
2 Professor titular de Oftalmologia da Universidade Federal do Piauí e chefe da Clínica Oftalmológica do Hospital Getúlio Vargas.
3 Professor-assistente de Oftalmologia da Universidade Federal do Piauí.
4 Médica oftalmologista do Hospital Getúlio Vargas.
5 Residente do 2a ano do Serviço de Oftalmologia da Universidade Federal do Piauí ¾ Hospital Getúlio Vargas.

Endereço para correspondência: R. Senador Cândido Ferraz, 1945, apto 401 - Teresina (PI) CEP 64049-250.


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