Janaína Jamile Ferreira Saraceno1; Ismênia Machado Mateus1; Tâmara Lopes Machado1; Fernando Pistarini Gonçalves1; Alan Diego Negretto3; Yoshitaka Nakashima4; André Marcelo Vieira Gomes5; Suel Abujamra6
DOI: 10.1590/S0004-27492007000600009
RESUMO
OBJETIVO: Descrever a relação entre os resultados visuais e a morfologia macular através da tomografia de coerência óptica (OCT) em pacientes submetidos à remoção da membrana epirretiniana idiopática. MÉTODOS: Dez olhos de 10 pacientes com diagnóstico de membrana epirretiniana idiopática foram incluídos neste estudo. Todos os olhos foram submetidos à vitrectomia posterior via pars plana pelo mesmo cirurgião, durante o período de fevereiro de 2002 a março de 2004. A acuidade visual corrigida usando a tabela de Snellen, bem como a retinografia, a angiofluoresceinografia, a biomicroscopia de fundo e a tomografia de coerência óptica pré e pós-operatórios foram obtidos de todos os pacientes em todas as visitas. No estudo da tomografia de coerência óptica foram avaliadas três características em cada imagem: presença de depressão foveal, presença de edema macular cistóide e média da espessura central macular. RESULTADOS: A idade média dos pacientes foi de 63,3 anos (57 a 78). Cinco pacientes eram do sexo masculino e 5, do sexo feminino. A acuidade visual pré-operatória variou de 20/80 a conta dedos a 1 metro. A acuidade visual melhorou pelo menos duas linhas de visão em 8 olhos (80%) e a metamorfopsia melhorou também na mesma proporção (80%). Quatro pacientes não apresentavam metamorfopsia com a tabela de Amsler, e os demais apresentavam melhora parcial. À tomografia de coerência óptica todos os olhos mantiveram o aumento da espessura central, variando de 232 a 605 µ (média= 351,9 µ). Três olhos mantiveram o edema macular cistóide. Quatro olhos apresentaram acuidade visual final melhor ou igual a 20/30. Neste grupo a média de espessura central foi de 277 µ (265 a 285 µ). A recuperação do contorno foveal foi observada em dois destes olhos. Nos quatro pacientes não havia edema macular cistóide residual. CONCLUSÃO: A tomografia de coerência óptica é uma ferramenta capaz de avaliar as alterações estruturais antes e depois da cirurgia para remoção de membrana epirretiniana idiopática. Os resultados funcionais da vitrectomia posterior via pars plana são satisfatórios embora outros fatores prognósticos possam estar envolvidos nos resultados visuais finais desta patologia.
Descritores: Membrana epirretiniana; Membrana basal; Acuidade visual; Edema macular cistóide; Tomografia de coerência óptica; Projetos piloto
ABSTRACT
PURPOSE: To describe the relation between visual results and macular morphology through optical coherence tomography (OCT) in patients submitted to removal of the idiopathic epiretinal membranes. METHODS: Ten eyes of ten patients with diagnosis of idiopathic epiretinal membranes underwent standard 20-G pars plana vitrectomy. Posterior hyaloid attachments were identified and dealt with. Idiopathic epiretinal membranes were removed in all cases. Corrected visual acuity, retinography, fluorescein angiography, fundus biomicroscopy and the optical coherence tomography in the pre- and postoperative periods were performed in all patients. In OCT, three characteristics were considered in each image: presence of foveal depression, presence of cystoid macular edema and mean central macular thickness. RESULTS: Pre-operative visual acuity varied from 20/80 to counting fingers. The mean age was 63 years, ranging from 57 to 78 years. Five patients were male and five female. Preoperative visual acuity (VA) varied from 20/80 to CD to 1 meter. An improvement in VA of at least two lines was noted in all cases and metamorphopsia in eight eyes (80%). Four patients did not present metamorphopsia according to Amsler grid test, and the remaining presented partial improvement. On optical coherence tomography all eyes maintained increased central thickness, ranging from 232 to 605 µ (mean of 351.9 µ). Three eyes maintained cystoid macular edema. Four eyes presented final VA better or equal to 20/30. In this group the mean central thickness was of 277 µ. Foveal contour was recovered in two of these eyes. Four patients had no residual cystoid macular edema. CONCLUSIONS: Optical coherence tomography is a tool that evaluates the structural changes before and after surgery to remove idiopathic epiretinal membranes. Although the foveal area architecture stays irregular six months after surgery, the visual outcomes are very promising. Other prognostics factors may be involved in the final visual results of this pathology.
Keywords: Epiretinal membrane; Basement membrane; Visual acuity; Macular edema, cystoid; Tomography, optical coherence; Pilot projects
INTRODUÇÃO
A membrana epirretiniana (MER) idiopática resulta da proliferação fibroglial na superfície da retina através de um defeito na membrana limitante interna (MLI), usualmente criado durante o descolamento do vítreo posterior(1).
A presença de MER na mácula é diagnosticada em 2,0 a 6,4% dos olhos submetidos à necropsia(2).
A cirurgia vítreo-retiniana é comprovadamente exitosa na remoção da MER atingindo melhora da acuidade visual em 80 a 90% dos casos(3). Fatores que podem influenciar o prognóstico cirúrgico incluem a acuidade visual pré-operatória, presença de pseudoburaco macular, presença de edema macular cistóide (EMC), vazamento detectado na angiofluoresceinografia e sua localização.
A tomografia de coerência óptica (OCT) é um método de não contato, não invasivo que produz imagens de alta resolução da retina(4).
Vários estudos mostraram correlação entre morfologia da MER e a sua patogênese(5). Pode ser utilizada para fornecer dados úteis no pré e pós-operatórios, permitindo associar os resultados anatômicos e funcionais após a cirurgia.
O objetivo desta análise é descrever através do OCT a morfologia macular após a remoção da MER idiopática e correlacionar os achados com a acuidade visual.
MÉTODOS
Dez olhos de dez pacientes com diagnóstico de MER idiopática foram incluídos neste estudo. Estes foram submetidos à vitrectomia posterior via pars plana (VVPP) pelo mesmo cirurgião durante o período de fevereiro de 2002 a março de 2004.
O estudo foi submetido à aprovação da Comissão de Ética Médica desta instituição e cada paciente assinou termo de consentimento livre e esclarecido previamente apresentado.
Pacientes com MER secundárias à retinopatia diabética, oclusões vasculares retinianas, descolamento de retina, uveítes ou trauma foram excluídos do estudo.
A acuidade visual (AV) com a melhor correção usando a tabela de Snellen, bem como a retinografia, a angiofluoresceinografia, a biomicroscopia e o OCT pré e pós-operatórios foram obtidos de todos os pacientes em todas as visitas. A presença de metamorfopsia foi avaliada em todos os pacientes na primeira e na última visita com a tabela de Amsler. O exame oftalmológico completo foi realizado no primeiro, terceiro e sexto mês após o procedimento cirúrgico.
Para a realização do OCT utilizou-se o scanner Stratus OCT III (Zeiss-Humphrey Instruments, Dublin, CA). Seis cortes centrados na mácula foram obtidos de todos os olhos, três na vertical e três na horizontal, na forma linear medindo 7 mm. A melhor imagem em cada posição foi selecionada para cada paciente, escolhendo as imagens com os maiores índices. Todas as imagens com ganhos menores que cinco foram descartadas.
Foram observadas três características em cada imagem: presença de depressão foveal, presença de edema macular cistóide (EMC) e média da espessura central macular.
Os exames foram obtidos no primeiro, terceiro e sexto mês após o procedimento cirúrgico.
Considerou-se recorrência, qualquer evidência biomicroscópica ou ao OCT da MER ou contração continuada da membrana limitante interna (MLI) e vasos retinianos no período posterior ao procedimento cirúrgico.
Todos os olhos foram submetidos à VVPP 20 gauge padrão de três entradas, com descolamento da hialóide posterior naqueles olhos em que a mesma encontrava-se colada. Foi realizada a remoção da MER com fórceps intra-ocular sem auxílio de corantes. A periferia retiniana foi examinada com identação em todos os pacientes antes do fechamento das esclerotomias.
RESULTADOS
A idade média dos pacientes foi de 63,3 anos variando de 57 a 78 anos. Cinco pacientes eram do sexo masculino e cinco do sexo feminino. A AV pré-operatória variou de 20/80 a CD a 1 metro. Seis pacientes eram fácicos e quatro pseudofacicos. Entre os olhos fácicos, 50% desenvolveram catarata durante o período de seguimento e foram submetidos à cirurgia de facoemulsificação com implante de lente intra-ocular.
Em todos os pacientes a remoção da MER foi realizada com sucesso e sem intercorrências. Em um olho houve recorrência da MER comprovada através do OCT, detectada três meses após o procedimento cirúrgico. Em outro houve a manutenção do pregueamento da membrana limitante interna (MLI) após seis meses do procedimento. Estes pacientes foram submetidos à nova VVPP para remoção da MER e da MLI respectivamente, sem que o paciente submetido à remoção da MLI apresentasse melhora da AV final.
Oito olhos apresentaram melhora da AV de pelo menos duas linhas de visão e da metamorfopsia. Quatro pacientes não apresentaram metamorfopsia à tabela de Amsler e os demais referiam melhora parcial.
Ao OCT, todos os olhos mantiveram o aumento da espessura central, com média de 351,9 µm (232 - 605 µm). Três olhos mantiveram o EMC (Tabela 1). Os resultados destas medidas foram comparados com os dados disponíveis na literatura(6), que consideram a espessura foveal média normal 174 ± 18 µm.
Quatro olhos apresentaram AV final melhor ou igual a 20/30. Neste grupo a média de espessura central era de 277 µm (265 - 285 µm) e a recuperação do contorno foveal foi observada em dois destes olhos. Nos quatro pacientes não havia edema macular cistóide (EMC) residual.
DISCUSSÃO
As imagens foveais obtidas através do OCT podem melhorar o entendimento sobre a reconstrução da anatomia da fóvea pós cirurgia e levar a novas idéias quanto à relevância clínica de certas características morfológicas.
Embora a maioria das MERs idiopáticas não causem baixa significativa da AV, alguns casos levam à perda progressiva da função visual(7). O constante desenvolvimento dos materiais e técnicas da cirurgia vítreo-retiniana permite intervenções cada vez mais precoces em olhos com metamorfopsia e AV pior que 20/50(8) objetivando melhorar cada vez mais a qualidade de vida dos pacientes.
A identificação de fatores prognósticos no emprego da VVPP para remoção da MER idiopática sempre foi objeto de estudo para muitos pesquisadores e dentre eles podemos destacar a AV pré-operatória e a duração dos sintomas(9-11).
No pós-operatório dos pacientes estudados por nosso grupo a AV melhorou significativamente em pelo menos duas linhas de visão em 80% dos casos e a espessura foveal diminuiu em todos os casos, porém, em nenhum caso atingiu-se a faixa de normalidade anatômica (174 ± 18 µm). Nossos resultados foram inferiores aos de outros autores(12) que as encontraram espessuras centrais normais em 32% dos pacientes.
Alguns autores relataram que o contorno foveal mantido não estava correlacionado com a AV. O contorno foveal retornou à sua configuração normal em apenas 20% neste estudo e em pacientes que apresentaram boa AV, no entanto mesmo em pacientes com a significativa melhora visual o contorno foveal não estava presente.
Considerando-se que não se optou pela retirada da MLI, o índice de recorrência do presente estudo foi de dois em dez pacientes, achados similares ao grupo sem remoção da MLI estudados por Park et al(13).
Confirmou-se que a persistência do edema macular cistóide (EMC) é um fator de pior prognóstico visual e nos casos em que ele foi identificado a AV variou de 20/200 a conta dedos.
A espessura e forma foveal, não retornaram à normalidade ao longo de seis meses de acompanhamento, embora os resultados visuais obtidos fossem bastante satisfatórios. Tal fato leva a crer que outros fatores prognósticos possam estar envolvidos. Um estudo prospectivo, randomizado e com maior amostra é necessário para confirmar tais hipóteses.
Alguns autores avaliaram a estrutura macular pós-operatória de 34 pacientes submetidos à VVPP para cirurgia de buraco macular e concluíram que os achados na retina externa, tais como a espessura do segmento externo dos fotorreceptores é mais importante que as características da retina interna, como a morfologia macular na determinação da AV final.
Estes autores observaram uma correlação entre a média da espessura dos fotorreceptores e a AV final, sugerindo que a integridade física desta camada é importante na função visual. Neste estudo não foi possível avaliar essa camada devido ao grande numero de pacientes com EMC residual, o que diminui a precisão da imagem para essa avaliação.
CONCLUSÕES
O OCT III é uma ferramenta capaz de avaliar a estrutura macular no pré e pós-operatórios da cirurgia de remoção da MER idiopática.
O OCT faz uma avaliação estrutural da mácula útil na análise pré e pós-operatórias na cirurgia de remoção da MER, podendo correlacionar aspectos anatômicos com a acuidade visual.
Fatores anatômicos que se mostraram relevantes neste estudo foram a presença ou não de EMC e a espessura macular final.
REFERÊNCIAS
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Endereço para correspondência:
Alan Diego Negretto.
Rua Dona Avelina, 77/161
São Paulo (SP)
CEP 04111-010
E-mail: [email protected]
Recebido para publicação em 23.10.2006
Última versão recebida em 02.06.2007
Aprovação em 22.08.2007
Trabalho realizado no Instituto Suel Abujamra (ISA) São Paulo (SP) - Brasil.