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Editorial

Toxicidade ocular causada pela cloroquina: relato de caso

Ocular toxicity caused by chloroquine: case report

Eliane Terumi Inada1; Karina Paula Watanabe1; Sérgio Gustavo Tanaka1; Luís Antônio Sakakisbara1

DOI: 10.1590/S0004-27492005000300027

RESUMO

Relatar um caso de toxicidade ocular causada pela cloroquina. Aferiu-se a acuidade visual de ambos os olhos em tabela de Snellen. Foram realizados biomicroscopia do segmento anterior, refração, oftalmoscopia, angiofluoresceinografia e retinografia numa paciente de 53 anos, sexo feminino, portadora de artrite reumatóide. Fez uso de cloroquina por 6 anos e havia parado há um ano, quando veio ao nosso serviço. Apresentava acuidade visual corrigida de 20/200 e 20/40. À biomicroscopia do segmento anterior apresentava lente intra-ocular no olho direito e catarata nuclear 1+/4+ no olho esquerdo, com opacidade corneana subepitelial inferior ao eixo visual em ambos os olhos. À oftalmoscopia, apresentava mácula com aspecto de tacho batido (atrofia do epitélio pigmentar da retina). A angiofluoresceinografia mostrou maculopatia com aspecto de olho de boi. Relata-se um caso típico de ceratopatia e maculopatia causados pela cloroquina.

Descritores: Cloroquina; Cloroquina; Degeneração macular; Doenças retinianas; Toxicidade de drogas; Fundo de olho; Mácula lútea; Relato de caso

ABSTRACT

To report a case of ocular toxicity due to chloroquine. The best visual acuity was measured in both eyes with the Snellen chart. Slit-lamp examination of anterior segment, refraction, dilated fundus examination, fluorescein angiography and retinography was done in a 53-year-old patient, female, with rheumatoid arthritis. She had used chloroquine during 6 years and had stopped for 1 year when she came to our service. She had best corrected visual acuity of 20/200 and 20/40. Slit-lamp examination showed intraocular lens in right eye and nuclear cataract (1+/4) in the other, and bilateral corneal subepithelial opacity inferior to the visual axis. Fundus examination showed macular area with retinal pigment epithelium atrophy. Fluorescein angiography showed a bull's eye maculopathy. Report of a typical keratopathy and maculopathy caused by chloroquine.

Keywords: Chloroquine; Chlroquine; Macular degeneration; Retinal diseases; Drug toxicity; Fundus oculi; Macula lutea; Case report


 

 

INTRODUÇÃO

A cloroquina tem sido usada no tratamento de muitas doenças como malária, lupus eritematoso sistêmico e discóide, artrite reumatóide, porfiria cutânea, urticária solar. Seu efeito colateral mais grave é a retinopatia, cuja freqüência varia de 0,001 a 40%, dependendo dos métodos e dos critérios diagnósticos(1-2). O objetivo deste estudo é relatar um caso de toxicidade ocular causada pela cloroquina.

Para a avaliação da paciente, aferiu-se a acuidade visual de ambos os olhos em tabela de Snellen. Foram realizadas biomicroscopia do segmento anterior, refração, oftalmoscopia, angiofluoresceinografia e retinografia.

 

RELATO DE CASO

Paciente de 53 anos, sexo feminino, portadora de artrite reumatóide, fez uso de cloroquina por 6 anos e havia parado há um ano, quando veio ao nosso serviço. Apresentava acuidade visual em olho direito de 20/200 e em olho esquerdo de 20/40 sem melhora com refração. À biomicroscopia do segmento anterior apresentava lente intra-ocular no olho direito e catarata nuclear 1+/4+ no olho esquerdo, com córnea verticilata em ambos os olhos. À oftalmoscopia apresentava mácula com aspecto de tacho batido bilateral (atrofia do epitélio pigmentar da retina) (Figura 1). A angiofluoresceinografia mostrou uma área central hiperfluorescente resultado de defeito em janela do epitélio pigmentar da retina em ambos os olhos (Figura 2).

 

 

 

 

COMENTÁRIOS

Os dois efeitos colaterais mais importantes da cloroquina no olho são a retinotoxicidade e os depósitos corneanos. Embora incomuns, as alterações retinianas são potencialmente graves; e a ceratopatia, mais comum, é inócua. A droga é excretada lentamente e concentra-se nas estruturas oculares que contêm melanina, como o epitélio pigmentar da retina e coróide(3).

A retinopatia pela cloroquina é irreversível e freqüentemente progressiva, estando relacionada com a dosagem cumulativa e à duração do tratamento(1,4-7). Há relatos de detecção precoce e tardia variando de 9 meses após início do tratamento a 7 anos depois de cessado o mesmo(8-9). Num estudo com pacientes usuários de cloroquina sem alterações no exame de fundo de olho, a sensibilidade ao contraste esteve dentro dos valores normais; porém a extensão das perdas na discriminação de cores foi positivamente correlacionada com a dose acumulada(10).

A ceratopatia pode ser encontrada depois de 3 dias do início da terapia, sendo reversível com a descontinuidade da droga(8). Não há prejuízo da acuidade visual e nenhuma diferença foi observada entre sexo, idade, duração do tratamento e dose acumulada(5,8,11).

A dose diária da droga parece determinar o desenvolvimento da doença ocular, não devendo ultrapassar 4 mg/kg/dia. Para prevenir a superdosagem, o cálculo deve ser feito baseado no peso ideal do paciente e não no seu peso atual, além de ser necessária a monitorização de suas funções hepática e renal(12).

A exposição solar aumenta o risco de retinopatia em pacientes tratados com cloroquina; portanto, óculos de sol devem ser recomendados(12).

Recomenda-se exame oftalmológico de rotina antes do início do tratamento e a cada 6 meses, uma vez que a retinopatia pode ser detectada precocemente.

 

REFERÊNCIAS

1. Cox NH, Paterson WD. Ocular toxicity of antimalarial in dermatology: a survery of current practice. Br J Dermatol. 1994;131(6):878-82.        

2. Finbloom DS, Silver K, Newsome DA, Gunkel R. Comparison of hydroxychloroquine and chloroquine use and the development of retinal toxicity. J Rheumatol. 1985;12(4):692-4.        

3. Kanski JJ. Distúrbios maculares adquiridos. In: Kanski JJ. Oftalmologia clínica. 4 ed. Rio de Janeiro: Rio Méd Livros; 2004. p.437-9.        

4. Martin LJ, Bergen RL, Dobrow HR. Delayed onset chloroquine retinopathy: case report. Ann Ophthalmol. 1978;10(6):723-6.        

5. Fishman GA. Retinal toxicity with the use of chloroquine or hydroxychloroquine. In: Fishman GA. Principle and practice of clinical electrophysiology of vision. San Francisco; American Academy of Ophthalmology; 1991. p.594-9.        

6. Nylander U. Ocular damage in chloroquine therapy. Acta Ophthalmol (Copenh). 1966;44(3):335-48.        

7. Voipio H. Incidence of chloroquine retinopathy. Acta Ophthalmol (Copenh). 1966;44(3):349-54.        

8. Puavilai S, Kunavisarut S, Vatanasuk M, Timpatanapong P, Sriwong ST, Janwitayanujit S, et al. Ocular toxicity of chloroquine among Thai patients. Int J Dermatol. 1999;38(12):934-7.        

9. Ehrenfeld M, Nesher R, Merin S. Delayed – onset chloroquine retinopathy. Br J Ophthalmol. 1986;70(4):281-3.        

10. Ventura DF, Silveira LCL, Nishi M,Costa MF, Gualtieri M, Santos RMA, et al. Color vision loss in patients treated with chloroquine. Arq Bras Oftalmol. 2003;66(Supl 5):9-15.        

11. Easterbrook M. Ocular effects and safety of antimalarial agents. Am J Med. 1988;85(4A):23-9.        

12. Mackenzie AH. Dose refinements in long-therm therapy of rheumathoid arthritis with antimalarials. Am J Med. 1983;75(1A):40-5.        

 

 

Endereço para correspondência
Eliane Terumi Inada
Av. Vera Cruz, 828 - Apto. 22
São José do Rio Preto (SP) Cep 15085-010
E-mail: [email protected]

Recebido para publicação em 24.05.2004
Versão revisada recebida em 03.12.2004
Aprovação em 15.12.2004

 

 

Trabalho realizado na disciplina de Oftalmologia do Hospital de Base da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (SP).
Nota Editorial: Após concluída a análise do artigo sob sigilo editorial e com a anuência de Dr. Ayrton Roberto Branco Ramos sobre a divulgação de seu nome como revisor dele, agradecemos sua participação nesse processo.


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