Open Access Peer-Reviewed
Editorial

Implementation of red reflex exam in children in the area of Botucatu Medical School Clinical Hospital - São Paulo, Brazil

Implantação do exame do reflexo vermelho em crianças da região do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu - SP - Brasil

Antonio Carlos Lottelli Rodrigues1; Rodrigo Bueno Prado1; Licério Miguel2

DOI: 10.1590/S0004-27492012000500008

ABSTRACT

PURPOSE: To describe the implantation of the red reflex test in 30 cities in the area of Botucatu Medical School Clinical Hospital, (480,337 inhabitants) and the creation of a reference Center for children with red reflex changes, the Red reflex screening and another Center for treatment of childhood cataract. METHODS: The red reflex exam was released in 30 cities of the surrounding Botucatu area, lectures were done in the cities invited to participate by the Regional Department of Health.109 pen torch ophthalmoscopes were distributed to the hospital maternities and primary care units. The Red reflex screening attended cases of altered or doubtful red reflex and established the diagnosis. The Center for treatment of childhood cataract performed the preoperative examination, surgical treatment and follow-up of children with cataracts. RESULTS: After one year the Red reflex screening attended 29 children, 17 males and 12 females, mean age and pattern deviation (PD) of 10.09 ± 20.35 months (7 days - 98 months old). 16 patients were referred with altered red reflex, with a mean age and pattern deviation of 13.17 ± 24.14 months (7 days - 98 months old). The alteration was confirmed in all of these cases. 13 children had cataract. In 13 children with doubtful exam, with a mean age and PD of 6.29 ± 14.46 months (7 days - 54 months old), the alteration was not confirmed in any of these patients. The incidence of negative red reflex found among newborns was 9.2/10,000 and the incidence cataracts in this same group was 7.9/10,000. CONCLUSION: We described the implantation of the red reflex exam in the Botucatu area, and the creation of a reference Center for eye examination of children with changes in the red reflex, and the creation of a reference Center for treatment of childhood cataract and difficulties.

Keywords: Cataract; Cataract; Ophthalmoscopes; Reflex, pupillary; Child

RESUMO

OBJETIVO: Descrever a implantação do teste de reflexo vermelho nas 30 cidades de inserção do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu, HC/FMB/UNESP (480.337 habitantes), a criação de um centro para referência de crianças com reflexo vermelho alterado ou duvidoso, a Triagem do reflexo vermelho e outro para o tratamento da catarata infantil, o Centro de tratamento da catarata infantil. MÉTODOS: O exame do reflexo vermelho foi divulgado em 30 cidades da região de Botucatu. Foram realizadas palestras aos municípios, convocados pelo Departamento Regional de Saúde VI do estado de São Paulo (DRS VI). Foram distribuídos 109 "pen torch ophthalmoscope", às maternidades e Unidades Básicas de Saúde (UBSs) das cidades. A Triagem do reflexo vermelho recebeu os casos de reflexo vermelho alterado ou duvidoso e estabeleceu o diagnóstico oftalmológico. O Centro de tratamento da catarata infantil realizou o exame pré-operatório, o tratamento cirúrgico e o acompanhamento das crianças com catarata. RESULTADOS: Após um ano de funcionamento a Triagem do reflexo vermelho atendeu 29 crianças, 17 do sexo masculino e 12 do feminino, com idade média e desvio padrão (dp) de 10,09 ± 20,35 meses (7 dias - 98 meses). 16 pacientes foram encaminhados com reflexo vermelho alterado, idade média e dp de 13,17 ± 24,14 meses (7 dias - 98 meses), a alteração foi confirmada em todos os casos, 13 deles apresentavam catarata. Em 13 encaminhamentos com reflexo duvidoso, idade média e dp de 6,29 ± 14,46 meses (7 dias - 98 meses), a alteração não se confirmou. A incidência de alterações do reflexo vermelho encontradas foi de 9,2/10.000 nascidos vivos e a incidência the catarata foi de 7,9/10.000 nascidos vivos. CONCLUSÃO: Descrevemos a implantação do Teste do reflexo vermelho na Região de Botucatu, a criação da Triagem do reflexo vermelho e do Centro de tratamento da catarata infantil e dificuldades encontradas.

Descritores: Catarata; Catarata; Oftalmoscópios; Reflexo pupilar; Vision tests; Criança

ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE

 

Implantação do exame do reflexo vermelho em crianças da região do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu - SP - Brasil

 

Implementation of red reflex exam in children in the area of Botucatu Medical School Clinical Hospital - São Paulo, Brazil

 

 

Antonio Carlos Lottelli RodriguesI; Rodrigo Bueno PradoI; Licério MiguelII

IMédico, Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Faculdade de Medicina de Botucatu, Botucatu (SP), Brasil
IIAcadêmico de Medicina, Faculdade de Medicina de Botucatu, Botucatu (SP), Brasil

Endereço de correspondências

 

 


RESUMO

OBJETIVO: Descrever a implantação do teste de reflexo vermelho nas 30 cidades de inserção do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu, HC/FMB/UNESP (480.337 habitantes), a criação de um centro para referência de crianças com reflexo vermelho alterado ou duvidoso, a Triagem do reflexo vermelho e outro para o tratamento da catarata infantil, o Centro de tratamento da catarata infantil.
MÉTODOS: O exame do reflexo vermelho foi divulgado em 30 cidades da região de Botucatu. Foram realizadas palestras aos municípios, convocados pelo Departamento Regional de Saúde VI do estado de São Paulo (DRS VI). Foram distribuídos 109 "pen torch ophthalmoscope", às maternidades e Unidades Básicas de Saúde (UBSs) das cidades. A Triagem do reflexo vermelho recebeu os casos de reflexo vermelho alterado ou duvidoso e estabeleceu o diagnóstico oftalmológico. O Centro de tratamento da catarata infantil realizou o exame pré-operatório, o tratamento cirúrgico e o acompanhamento das crianças com catarata.
RESULTADOS: Após um ano de funcionamento a Triagem do reflexo vermelho atendeu 29 crianças, 17 do sexo masculino e 12 do feminino, com idade média e desvio padrão (dp) de 10,09 ± 20,35 meses (7 dias - 98 meses). 16 pacientes foram encaminhados com reflexo vermelho alterado, idade média e dp de 13,17 ± 24,14 meses (7 dias - 98 meses), a alteração foi confirmada em todos os casos, 13 deles apresentavam catarata. Em 13 encaminhamentos com reflexo duvidoso, idade média e dp de 6,29 ± 14,46 meses (7 dias - 98 meses), a alteração não se confirmou. A incidência de alterações do reflexo vermelho encontradas foi de 9,2/10.000 nascidos vivos e a incidência the catarata foi de 7,9/10.000 nascidos vivos.
CONCLUSÃO: Descrevemos a implantação do Teste do reflexo vermelho na Região de Botucatu, a criação da Triagem do reflexo vermelho e do Centro de tratamento da catarata infantil e dificuldades encontradas.

Descritores: Catarata/diagnóstico; Catarata/congênita; Oftalmoscópios; Reflexo pupilar; Vision tests; Criança


ABSTRACT

PURPOSE: To describe the implantation of the red reflex test in 30 cities in the area of Botucatu Medical School Clinical Hospital, (480,337 inhabitants) and the creation of a reference Center for children with red reflex changes, the Red reflex screening and another Center for treatment of childhood cataract.
METHODS: The red reflex exam was released in 30 cities of the surrounding Botucatu area, lectures were done in the cities invited to participate by the Regional Department of Health.109 pen torch ophthalmoscopes were distributed to the hospital maternities and primary care units. The Red reflex screening attended cases of altered or doubtful red reflex and established the diagnosis. The Center for treatment of childhood cataract performed the preoperative examination, surgical treatment and follow-up of children with cataracts.
RESULTS: After one year the Red reflex screening attended 29 children, 17 males and 12 females, mean age and pattern deviation (PD) of 10.09 ± 20.35 months (7 days - 98 months old). 16 patients were referred with altered red reflex, with a mean age and pattern deviation of 13.17 ± 24.14 months (7 days - 98 months old). The alteration was confirmed in all of these cases. 13 children had cataract. In 13 children with doubtful exam, with a mean age and PD of 6.29 ± 14.46 months (7 days - 54 months old), the alteration was not confirmed in any of these patients. The incidence of negative red reflex found among newborns was 9.2/10,000 and the incidence cataracts in this same group was 7.9/10,000.
CONCLUSION: We described the implantation of the red reflex exam in the Botucatu area, and the creation of a reference Center for eye examination of children with changes in the red reflex, and the creation of a reference Center for treatment of childhood cataract and difficulties.

Keywords: Cataract/diagnosis; Cataract/congenital; Ophthalmoscopes; Reflex, pupillary; Child


 

 

INTRODUÇÃO

Algumas das importantes afecções oculares que ocorrem no recém-nascido e na criança como a catarata, o retinoblastoma e outras alterações da córnea ou do polo posterior, podem ser detectadas usando um teste prático, conhecido como exame do reflexo vermelho ou teste do reflexo de Bruckner. O exame consiste na visualização da pupila da criança, usando oftalmoscópio direto, colocado há cerca de um braço de distância(1).

Para ser considerado normal, o examinador deve ver através da pupila dos dois olhos um reflexo vermelho e simétrico. Qualquer alteração no reflexo vermelho como manchas escuras, ausência ou assimetria de reflexo, ou presença de reflexo branco (leucocoria) são motivos para se suspeitar de doenças oculares, devendo a criança ser referida para exame especializado com um oftalmologista(1).

Tradicionalmente o oftalmoscópio é usado para o exame do reflexo vermelho. No entanto, o uso de modelos simplificados como o "pen torch ophthalmoscope" (PTO) (Apramed Indústria e Comércio de Aparelhos Médicos Ltda.) podem representar uma alternativa barata e possibilitam o uso por profissionais de saúde não médicos treinados na detecção de anormalidades do reflexo vermelho(2).

A causa mais frequente de alteração do reflexo vermelho na infância é a catarata infantil, doença tratável que apresenta resultado visual favorável desde que diagnosticada e tratada precocemente(3).

A catarata infantil é aquela presente ao nascimento (congênita) ou que se desenvolve até os 12 anos de idade(4). Sua prevalência é muito variável sendo de 1 a 4/10.000 nascidos em países desenvolvidos e 5 a 15/10.000 nascidos em países em desenvolvimento. A relação inversa entre prevalência e índice de desenvolvimento é resultado da melhor assistência pré-natal e melhor prognóstico visual sempre que o diagnóstico e o tratamento adequados são realizados precocemente. A catarata é responsável por 14% das crianças cegas do mundo(5).

No Brasil, as estatísticas são insuficientes e nos últimos anos, por força de leis o exame do reflexo vermelho começa a ser realizado nas maternidades brasileiras. A primeira lei que obriga o teste do reflexo vermelho na maternidade foi aprovada em 5 de setembro de 2002 no estado do Rio de Janeiro, desde então várias cidades e estados vêm criando leis municipais e estaduais obrigando a realização do exame. No estado de São Paulo, somente em 2007 a Lei Estadual nº 12.551 de 5 de março, tornou obrigatório o exame nas maternidades do estado.

Além da importância de se pesquisar o reflexo vermelho nas maternidades, sua pesquisa é preconizada pela American Academy of Pediatrics nas consultas pediátricas de rotina com um, dois, quatro, seis e nove meses, um, dois, três, quatro, cinco, seis, oito, 10 e 12 anos(6).

O Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP é referência para 30 municípios (480.337 habitantes) na região centro-oeste do estado de São Paulo. Existiam obstáculos fundamentais para que o exame fosse realizado e para que o diagnóstico precoce trouxesse efetivamente benefício às crianças. Muitas maternidades não dispunham de oftalmoscópio, os profissionais envolvidos não haviam sido capacitados para realização técnica e interpretação do exame e o serviço de referência dos pacientes não estava estruturado.

Diante do exposto, justificou-se a necessidade da criação de um projeto com ações que viabilizassem: a concretização do teste do reflexo-vermelho, a criação de um serviço de referência para exame oftalmológico e o tratamento da catarata infantil. O objetivo deste artigo é descrever: a implementação do teste do reflexo vermelho nas 30 cidades de inserção do Hospital das Clínicas da Faculdade de medicina de Botucatu, HC/FMB/UNESP (480.337 habitantes), a criação de um Centro para referência de crianças com reflexo vermelho alterado ou duvidoso, a Triagem do reflexo vermelho (TRV) e outro para o tratamento da catarata infantil, o Centro de tratamento da catarata infantil (CTCI), as dificuldades encontradas e resultados obtidos após um ano de funcionamento.

 

MÉTODO

Em parceria com o Departamento Regional de Saúde VI (DRS VI) do estado de São Paulo, regional em que se insere o HC/FMB/UNESP, divulgamos o teste do reflexo vermelho através de uma matéria publicada em jornal regional, duas entrevistas em rádios regionais e uma entrevista televisiva também regional. Foram confeccionados e distribuídos pela DRS VI 5.000 folhetos explicativos à população e aos profissionais de saúde. Esses folhetos foram distribuídos pelos postos de saúde das cidades. As cidades foram divididas em quatro grupos de acordo com a localidade, para cada grupo foi ministrada uma palestra abordando a importância da realização do exame e quais doenças poderiam ser detectadas, com uma breve explicação sobre cada uma delas. Foi enfatizada a importância de se realizar o exame não só nas maternidades, mas em toda consulta pediátrica(1). Também foi orientado e estimulado a realização do exame com o PTO por outros profissionais de saúde não médicos, principalmente agentes pertencentes aos "Programas de Saúde da Família" (PSF). Após a palestra realizamos treinamento prático utilizando o PTO. A palestra e o treinamento prático foram repetidos por mais duas vezes no município de Botucatu, para as cidades que não responderam à primeira convocação.

Nas palestras foram entregues 109 PTO para cada uma das 17 maternidades e 92 unidades básicas de saúde dos municípios presentes (Figura 1). Estes instrumentos foram montadas ao custo de R$ 200,00, valor três vezes menor que o de um oftalmoscópio direto simples (valores de janeiro de 2008).

 

 

Orientamos o encaminhamento dos casos detectados com reflexo alterado ou duvidoso a um serviço de triagem criado para receber estas crianças no HC/FMB/UNESP, a TRV. Esta triagem passou a atender a partir de julho de 2008, em um dia fixo da semana. Desde então, toda criança que comparece com diagnóstico de reflexo alterado ou duvidoso é atendida, sem necessidade de agendamento prévio. As crianças atendidas no primeiro ano de funcionamento da triagem foram divididas por idade, sexo, motivo do encaminhamento (reflexo alterado ou duvidoso), se a alteração foi confirmada ou não e o diagnóstico.

Foi criado um centro especializado no tratamento da catarata infantil o CTCI composto por ambulatório próprio e centro cirúrgico especializado. As crianças com catarata infantil triadas pela Triagem do reflexo vermelho foram avaliadas pelo CTCI e divididas em relação à idade, sexo, lateralidade e necessidade de tratamento clínico ou cirúrgico. As crianças submetidas à cirurgia foram examinadas, sob anestesia geral, com medida da pressão intraocular (PIO) utilizando tonômetro de Perkins, ceratometria média utilizando ceratômetro portátil (Retinomax K plus 2, Righton) e comprimento axial utilizando biômetro de contato (Microscan Model 100A+, Sonomed).

 

RESULTADOS

Das 30 cidades convocadas para as reuniões, uma delas, com 1.741 habitantes (0,36% da população da região), não compareceu para ouvir a palestra, receber o treinamento e o PTO embora tenha sido reconvocada pela DRS VI por mais duas vezes. Em um ano de funcionamento a TRV atendeu 29 crianças, 17 do sexo masculino e 12 do sexo feminino, com idade média e desvio padrão (dp) de 10,09 ± 20,35 meses (7 dias - 96 meses), destas 17 (58,6%) tinham idade igual ou menor que 3 meses, 16 pacientes foram encaminhados com reflexo vermelho alterado, com idade média e dp de 13,17 ± 24,14 meses (7 dias - 96 meses) e 13 com reflexo duvidoso, com idade média e dp de 6,29 ± 14,46 meses (7 dias - 54 meses). A alteração foi confirmada nos 16 pacientes encaminhadas com reflexo alterado e não se confirmou em nenhum paciente encaminhado com reflexo duvidoso. Dos 16 pacientes com reflexo alterado uma menina de 4 meses apresentava leucoma corneano no olho direito, um menino de 28 meses apresentava descolamento de retina no olho esquerdo e outro de 96 meses apresentava catarata traumática também no olho esquerdo, 13 crianças (81,25%) apresentavam catarata congênita/juvenil, sendo destas, 6 com catarata bilateral e 7 com catarata unilateral.

Para o cálculo da incidência considerou-se que as crianças com alterações detectadas nas maternidades deveriam chegar ao serviço pelo menos até os 3 meses de idade e que o número de nascidos vivos na região neste período ficou em torno de 7.600 segundo o "Datasus" do ministério da saúde, considerou-se também que recebemos sete pacientes com reflexo alterado nesta faixa etária, assim teremos uma incidência de exame do reflexo vermelho alterado, detectado na maternidade, de 9,2/10.000 nascidos vivos. Desses, 6 tinham catarata (7,9/10.000 nascidos vivos) sendo 4 com catarata bilateral (5,3/10.000 nascidos vivos).

A média e dp de idade dos pacientes com catarata congênita/juvenil foi de 6,50 ± 6,97 meses (0,3 - 22,26 meses), dos pacientes com catarata congênita/juvenil bilateral foi de 7,74 ± 7,13 meses (1,4 meses - 18,8 meses) e unilaterais 6,37 ± 7,57 meses (0,3 - 22,26 meses). A média e dp do comprimento axial dos olhos com catarata foi de 18,97 ± 1,94 milímetros (17,20 - 23,12 mm), e a média e dp da ceratometria média foi de 46,93 ± 3,26 dioptrias (43,00 - 52,75 D) (Gráfico 1). A média e dp da PIO nestes olhos foi de 9,63 ± 1,89 milímetros de mercúrio (7 - 12 mmHg).

 

 

DISCUSSÃO

O desinteresse de algumas secretarias municipais de saúde é desestimulante, no entanto a maioria é bastante interessada e atuante. O público que compareceu às palestras era composto em sua maioria por enfermeiros, auxiliares de enfermagem e agentes de saúde do "Programa de Saúde da Família" (PSF), e poucos pediatras. Este fato inicialmente nos frustrou, no entanto, percebemos que o esclarecimento das pessoas envolvidas, mesmo que não médicas, geram cobranças, fazendo com que médicos busquem informações sobre o assunto.

Grande parte das crianças encaminhadas (41,37%), tanto como suspeitas como com reflexo alterado não eram recém-nascidos que tiveram exame alterado ou duvidoso realizado na maternidade. Estes encaminhamentos provavelmente decorreram da ação de profissionais não médicos e não de pediatras nos atendimentos ambulatoriais, pois a frequência destes profissionais nas palestras foi pequena e sabemos das dificuldades em mudar hábitos de profissionais médicos, principalmente acrescentando "trabalho extra" e não obrigatório, aos atendimentos ambulatoriais do serviço público. Em relação ao encaminhamento de recém-nascidos, acreditamos que tenha sido sim pela ação dos pediatras nas maternidades, obrigados a realizar o exame por força da lei nº 12.551 do Estado de São Paulo.

O grande número de pacientes encaminhados com reflexo duvidoso provavelmente se deveu a dúvidas e dificuldades encontradas por profissionais iniciantes na prática do exame. Estas dúvidas e dificuldades são ainda maiores em crianças recém-nascidas o que pode ser uma das justificativas para que a média de idade das crianças encaminhadas com reflexo duvidoso fosse menor que as encaminhadas com reflexo alterado. Outro fator que pode ter influenciado neste dado é a obrigatoriedade da realização do exame na maternidade. Isto é apenas uma tendência já que não encontramos diferença estatística entre os dois grupos (p=0,181; teste de Mann-Whitney).

Infelizmente em nosso estudo não pesquisamos em detalhes a origem dos exames que geraram os encaminhamentos, nem quantos foram feitos por profissionais médicos ou não médicos.

Não encontramos dados na literatura quanto à incidência de reflexo vermelho alterado em recém-nascidos, na verdade eles se confundem com dados de incidência de catarata devido a sua grande frequência. Em relação à incidência de catarata, no que consideramos como recém-nascido, foi quase duas vezes maior (7,9/10.000 nascidos vivos) do que esperávamos para uma região considerada desenvolvida e bem assistida em relação à saúde, comparada a média brasileira e ficando dentro da faixa de países em desenvolvimento(5). Temos que considerar ainda que provavelmente nem todas as crianças nascidas foram examinadas e que crianças detectadas com reflexo alterado podem não ter chegado serviço. Não criamos mecanismos de controle para garantir isto, no entanto estes dados podem servir de parâmetro para estudos futuros, pois a literatura, principalmente brasileira é muito pobre em relação a eles. Estas incidências, que consideramos alta, por outro lado mostra indiretamente o cumprimento de nossos objetivos de viabilizar o teste do reflexo vermelho na região e centralizar o encaminhamento destas crianças.

A catarata foi a principal causa de alteração do reflexo vermelho, corroborando com a literatura(7). O gráfico da distribuição dos valores de comprimento axial e média ceratométrica destes pacientes em relação à idade, possuem linha de tendência logarítmico como era de se esperar(7-8).

No Brasil o uso do oftalmoscópio é competência médica. No entanto, o exame do reflexo vermelho é um exame tecnicamente fácil e que pode ser realizado por paramédicos treinados, como acontece em outros países(2). Profissionais não médicos treinados utilizando o PTO podem auxiliar no diagnóstico de alterações no reflexo vermelho que se manifestem após o nascimento. Os agentes de saúde dos PSFs também poderiam exercer um importante papel neste sentido. Além disso os PTO distribuídos não são oftalmoscópios, portanto não existe nenhuma restrição legal ao seu uso.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) propõe o "Vision 2020 - The Right to Sight", uma iniciativa global para eliminação da cegueira prevenível até o ano de 2020(9). A criação de uma lei federal que torna obrigatório o exame do reflexo vermelho nas maternidades brasileiras contribuiria para prevenção da cegueira infantil em nosso país. Precisamos sim concentrar esforços neste sentido, no entanto não podemos nos esquecer que as doenças que levam a alterações do reflexo vermelho podem estar presentes ao nascimento ou se manifestar posteriormente(10). Devemos criar nos pediatras o hábito de examinar os olhos e realizar o exame do reflexo vermelho em toda consulta de rotina(6), assim como examina o ouvido e a garganta. Isso não é ensinado em nossas escolas médicas. O exame do reflexo vermelho na maternidade é necessário, mas não suficiente.

A TRV continua recebendo crianças com reflexo vermelho alterado e duvidoso, assim como o CTCI a tratar a catarata infantil, estes serviços estão se fortalecendo, aumentaram sua área de abrangência para toda DRS IV e já começam a receber crianças das DRSs vizinhas. A criação e fortalecimento desses centros são de extrema importância para organização do serviço público de saúde, servindo de base para a criação de redes de encaminhamento.

 

CONCLUSÃO

Descrevemos o processo para implementação do projeto que viabilizou a realização do teste do reflexo vermelho na região de Botucatu.

A sua implementação permitiu a triagem de cerca de 7.600 crianças tendo sido recebidas 29 para avaliação em Centro de referência sendo 16 crianças portadoras de doenças oculares e destas, 13 portadoras de catarata congênita/juvenil.

O estudo também mostra que o "Pen torch ophthalmoscope" (PTO) pode ser uma ferramenta importante na disseminação do exame do reflexo vermelho e combate da cegueira na infância.

 

REFERÊNCIAS

1. Red reflex examination in infants. Section on Ophthalmology. American Academy of Pediatrics. Pediatrics. 2002;109(5):980-1.         

2. Pon JA, Bevin TH, Herbison P, Taylor BJ, Sanderson G. A novel instrument for assessing the retinal red reflex for non-ophthalmic health professionals. Clin Exp Optom. 2005;88(3):160-4.         

3. Meier P, Sterker I, Tegetmeyer H. [Leucocoria in childhood]. Klin Monbl Augenheilkd. 2006;223(6):521-7. German.         

4. Robinson GC, Jan JE, Kinnis C. Congenital ocular blindness in children, 1945 to 1984. Am J Dis Child. 1987;141(12):1321-4.         

5. Foster A, Gilbert C. Cataract in children. Acta Paediatr. 2003;92(12):1376-8.          Comment on: Acta Paediatr. 2003;92(12):1468-73.         

6. Recommendations for preventive pediatric health care. Committee on Practice and Ambulatory Medicine. Pediatrics. 1995;96(2 Pt 1):373-4        

7. Trivedi RH, Wilson ME. Biometry data from caucasian and african-american cataractous pediatric eyes. Invest Ophthalmol Vis Sci. 2007;48(10):4671-8.         

8. Trivedi RH, Wilson ME. Keratometry in pediatric eyes with cataract. Arch Ophthalmol. 2008;126(1):38-42.         

9. VISION 2020: the right to sight. Global initiative for the elimination of avoidable blindness [Internet]. Geneva: World Health Organization; revised February 2000. Fact Sheet 213. [cited 2011 Jan 24]. Available from: https://apps.who.int/inf-fs/en/fact213.html        

10. Committee on Practice and Ambulatory Medicine and Section on Ophthalmology; American Association of Certified Orthoptists; American Association for Pediatric Ophthalmology and Strabismus; American Academy of Ophthalmology. Eye examination in infants, children, and young adults by pediatricians. Pediatrics. 2003;111(4 Pt 1):902-7.         

 

 

Endereço de correspondências:
Antonio Carlos Lottelli Rodrigues
Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço, UNESP
Distrito de Rubião Jr
Botucatu - SP - 18618-970 - Brasil
E-mail: [email protected]

Submetido para publicação: 28 de março de 2012
Aceito para publicação: 9 de agosto 2012
Financiamento: Fundação de Auxílio à Pesquisa do Estado de São Paulo FAPESP, Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) (Programa de Pesquisa para o SUS - PPSUS).
Divulgação de potenciais conflitos de interesse: A.C.L.Rodrigues, Nenhum; R.B.Prado, Nenhum; L.Miguel, Nenhum.
Projeto número 2363/2007, aprovado pelo comitê de ética e pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu.

 

 

Trabalho realizado no Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço - Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" - Faculdade de Medicina de Botucatu, Botucatu (SP), Brasil.


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