Open Access Peer-Reviewed
Editorial

Eficácia terapêutica do interferon alfa em criança com hemangioma gigante craniofacial: relato de caso

Therapeutical effectiveness of interferon alpha in a child with craniofacial giant hemangioma: case report

Nilson Lopes da Fonseca Junior1; Sung Bok Cha2; Jairo Cartum3; José Ricardo Carvalho Lima Rehder4

DOI: 10.1590/S0004-27492008000300023

RESUMO

O hemangioma é o tumor benigno mais freqüente da infância. O hemangioma capilar geralmente apresenta-se como uma mancha ou tumoração violácea bem delimitada. O diagnóstico destas lesões é clínico. O hemangioma gigante é rara e extensa variação do hemangioma capilar, que geralmente ocorre em recém-nascidos e lactentes. Várias são as modalidades terapêuticas, como a injeção intralesional de corticóide, laserterapia, injeção intralesional de soluções esclerosantes, corticoterapia sistêmica, cirurgia, radioterapia e embolização. Novas modalidades terapêuticas têm sido desenvolvidas, com o objetivo de se obter melhores resultados e possibilitar o tratamento de lesões de difícil acesso cirúrgico e refratárias às modalidades terapêuticas utilizadas rotineiramente. Os melhores resultados tem sido obtidos com o interferon alfa. Este é um caso de uma paciente com três meses de idade, que apresentava desde o nascimento, tumoração arroxeada e amolecida em pálpebra superior do olho direito, lesões cutâneas planas e arroxeadas em região temporal e parietal direita. Realizada tomografia computadorizada de crânio evidenciando processo expansivo orbitário vascularizado com extensão para fossa média, seio cavernoso e fossa posterior. O tratamento inicial foi a corticoterapia oral durante quarenta dias, com redução progressiva por quatro semanas. Com o quadro praticamente inalterado, foi iniciado o tratamento com interferon alfa, na dose de 3.000.000 U/m², subcutâneo, três vezes por semana. Após 9 meses de tratamento, observa-se apenas uma pequena lesão orbitária residual. Neste caso, o interferon alfa apresentou-se como boa opção no tratamento do hemangioma gigante craniofacial.

Descritores: Hemangioma capilar; Hemangioma capilar; interferon alfa; Relatos de casos

ABSTRACT

Hemangiomas are the most commom benign tumors of infancy. Capillary hemangioma generally is presented as a spot or well-defined purple lesion. The diagnosis of these tumors is based on physical examination. Giant hemangioma is a rare and extensive variation of capillary hemangioma, that generally occurs in newborns and suckling infants. There are several therapeutical modalities, as the intralesional injection of steroids, laser therapy, intralesional injection of sclerosing solutions, surgery, radiotherapy and embolization. New therapeutical modalities have been developed, with the objective of getting better results and to make possible the treatment of the lesions of difficult surgical access or refractory cases to the used therapeutical modalities. The best results have been observed with interferon-alpha. This is a case of a patient with three months of age, that presented since birth, a purplish tumor in the superior eyelid of the right eye, plain and purplish cutaneous lesions in the temporal and parietal right region. On computed tomography of the skull, an orbital expansive vascularized process with intracranial extension could be observed. Systemic therapy with steroids was the initial treatment, during forty days, with gradual reduction for four weeks. With the practically unchanged clinical findings, the treatment with interferon-alpha was indicated, in the dose of subcutaneous 3.000.000 U/m², three times a week. After 9 months of treatment, a small residual orbital lesion was observed. In this case, interferon-alpha is presented as a good option for the treatment of craniofacial giant hemangioma.

Keywords: Hemangioma, capillar; Hemangioma, capillar; Interferon-alpha; Case reports


 

 

INTRODUÇÃO

O hemangioma é o tumor benigno mais freqüente da infância, apresentando maior incidência na raça branca, sexo feminino (3:1) e prematuros (22%). Os hemangiomas são classificados como capilar, cavernoso e misto(1-3).

A incidência do hemangioma capilar nos recém-nascidos é de 1 a 3%, e aumenta para 10% no primeiro ano de vida. Estas lesões são classificadas como hamartomas, e apresentam uma intensa proliferação do endotélio vascular(1-3).

O hemangioma capilar geralmente apresenta-se como uma mancha ou tumoração violácea bem delimitada. Durante o primeiro ano de vida, acontece uma fase proliferativa, com conseqüente aumento da lesão(1-2,4). Após este período inicia-se um processo de regressão lenta e espontânea. Aproximadamente 70% dos casos regridem completamente até os 7 anos de idade(5).

O diagnóstico destas lesões é clínico. O estudo de imagem torna-se necessário para o diagnóstico diferencial e para definir a extensão da lesão, principalmente no hemangioma capilar gigante(1-2,4,6).

O hemangioma gigante é uma rara e extensa variação do hemangioma capilar, que geralmente ocorre em recém-nascidos e lactentes, causando repercussão funcional e/ou estética, principalmente quando localizadas na região craniofacial e torácica(1).

A injeção intralesional de corticóide é considerada a primeira escolha no tratamento do hemangioma capilar(1-4,7-9). França et al. relatam bons resultados no tratamento de lesões palpebrais e orbitárias com a infiltração intralesional de triancinolona(9).

Outras opções de tratamento seriam a laserterapia (laser de CO2 ou Yag laser) e a injeção intralesional de soluções esclerosantes (Setrol®) ou bleomicina(3,7,10).

Nos casos de difícil acesso, a corticoterapia sistêmica está indicada(1-3,7). A cirurgia está indicada em casos refratários ao tratamento medicamentoso(1-2,11). A radioterapia e a embolização estão atualmente em desuso(2).

Novas modalidades terapêuticas têm sido desenvolvidas, com o objetivo de se obter melhores resultados, evitar efeitos adversos ao uso de corticóide e possibilitar o tratamento de lesões de difícil acesso cirúrgico e refratárias às modalidades terapêuticas utilizadas rotineiramente(1-2,4).

Os melhores resultados têm sido obtidos com o interferon alfa. Vários autores relatam a sua eficácia, baseado nas suas propriedades antiangiogênicas(1-2,6,12-14).

O objetivo deste trabalho é relatar a eficácia do interferon alfa no tratamento do hemangioma gigante craniofacial em uma criança de 3 meses de idade.

 

RELATO DO CASO

I.P.F., 3 meses de idade, sexo feminino, branca, apresentando tumoração arroxeada na pálpebra superior do olho direito desde o nascimento. Responsável (mãe) procurou atendimento no Setor de Órbita do Ambulatório de Oftalmologia da Faculdade de Medicina do ABC, referindo piora súbita há 15 dias.

Negava febre ou queda do estado geral. Nascida de parto cesárea, sem intercorrências, com peso de 2.900 g. Sem antecedentes maternos pré-natais.

Ao exame físico apresentava-se em bom estado geral e adequado para a idade. À inspeção estática apresentava lesões cutâneas planas de coloração vermelho-arroxeado em região temporal e parietal à direita (Figura 1).

 

 

Ao exame oftalmológico apresentava uma tumoração em região de pálpebra superior direita de consistência amolecida, indolor, com coloração arroxeada (Figura 1).

No choro, a manobra de Valsalva era negativa, assim como a ausculta e o frêmito, no repouso. No exame sob narcose, observou-se discreta quemose temporal, pressão intra-ocular de 15 mmHg em ambos os olhos e fundoscopia sem alterações.

O exame de tomografia computadorizada de órbita e crânio (Figura 2) mostra a presença de uma lesão expansiva, vascularizada ocupando a cavidade orbitária direita, causando proptose do globo ocular direito. Esta lesão estende-se para fossa média, seio cavernoso e fossa posterior. Observa-se a presença de uma lesão com características semelhantes e menores dimensões na topografia do IV ventrículo. Após investigação sistêmica, a presença de hemangiomas viscerais foi descartada.

 

 

O diagnóstico foi baseado nos achados do exame clínico e no estudo por imagem. Neste momento, iniciou-se o tratamento com corticóide via oral (prednisona), 60 mg/m2/dia, divididas em 3 doses diárias durante quarenta dias, com redução lenta em 4 semanas.

No término da corticoterapia, o quadro clínico apresentava-se praticamente inalterado. Devido à extensão e localização da lesão, optou-se por tratamento clínico com interferon alfa. Foi utilizada uma dose de 3.000.000 U/m2, por via subcutânea, 3 vezes por semana durante 9 meses.

Houve importante melhora clínica (Figura 3) e o exame de ressonância magnética de órbita, durante o tratamento com interferon alfa, apresentou acentuada redução das dimensões da lesão (Figura 4).

 

 

 

 

A paciente não apresentou efeitos colaterais ao uso do interferon durante os 9 meses de tratamento, e permanece em seguimento ambulatorial.

 

COMENTÁRIOS

A utilização do interferon alfa no tratamento do hemangioma capilar tem sido relatado na literatura, principalmente nos casos refratários à corticoterapia e nos hemangiomas gigantes(1-2,6,12-14).

Vários estudos demonstram excelentes resultados com doses de 3 milhões U/m2 diariamente por via subcutânea. Geralmente o tratamento é realizado por um período de 3 a 12 meses(1-2,6). Neste caso o tratamento foi realizado por 9 meses, com um dose diária de 3 milhões U/m2, 3 vezes por semana.

A eficácia do interferon está relacionada às suas propriedades antiangiogênicas, induzindo a involução precoce do hemangioma, através do bloqueio da migração e da proliferação de células endoteliais, musculares lisa e fibroblastos, inibindo a produção de colágeno e do fator de crescimento fibroblástico(1-2).

Alguns efeitos colaterais são relatados na literatura como febre, neutropenia, e aumento da aminotransferase sérica(1-2,6,14). Esta paciente, entretanto, não apresentou estes efeitos adversos.

A indicação deste tipo de tratamento é baseada na ineficácia da corticoterapia em alguns casos e a chance de complicações, com caráter funcional e/ou cosmético, dependendo da sua localização, tamanho e fase de evolução(1-2,12-14).

 

CONCLUSÃO

Neste caso, o interferon alfa apresentou-se como uma boa opção no tratamento do hemangioma gigante craniofacial.

 

REFERÊNCIAS

1. Oak SN, Viswanath N. Management of hemangiomas in children. Indian J Dermatol Venereol Leprol. 2006;72(1):1-4         

2. Damas Mateache B, Menéndez Suso JJ, Abelairas Gómez JM, Albajara Velasco L, Peralta Calvo J, Verdú Sánchez C, Royo Orejas A. [Interferon alpha and infantile orbital hemangioma]. Arch Soc Esp Oftalmol. 2003;78 (11):623-9. Spanish.         

3. O'Keefe M, Lanigan B, Byrne SA. Capillary haemangioma of the eyelids and orbit: a clinical review of the safety and efficacy of intralesional steroid. Acta Ophthalmol Scand. 2003;81(3):294-8.         

4. Malamou-Mitsi VD, Goussia A, Andronikou S, Stefanou D, Dallas P, Lapatsanis PD. Giant hemangioma in infant. A case presentation and literature review. Arch Anat Cytol Pathol. 1996;44(4):199-201.         

5. Stigmar G, Crawford JS, Ward CM, Thomson HG. Ophthalmic sequelae of infantile hemangiomas of the eyelids and orbit. Am J Ophthalmol. 1978; 85(6):806-13.         

6. Szymik-Kantorowicz S, Kobylarz K, Krysta M, Górecki W, Bysiek A, Celmer E, Dzierzega M. Interferon-alpha in the treatment of high-risk haemangiomas in infants. Eur J Pediatr Surg. 2005;15(1):11-6. Comment in: Eur J Pediatr Surg. 2007;17(2):147.         

7. Lloret P. [Medical treatment of haemangiomas]. An Sist Sanit Navar. 2004;27 Suppl 1:81-92. Spanish.         

8. Kushner BJ. The treatment of periorbital infantile hemangioma with intralesional corticosteroid. Plast Reconstr Surg. 1985;76(4):517-26.         

9. França VP, Soares EJC, Alvarenga DP. Hemangioma da infância, infiltração intralesional de triamcinolona: nossa experiência com 13 casos. Arq Bras Oftalmol. 1992;55(3):124-8.         

10. David LR, Malek MM, Argenta LC. Efficacy of pulse dye laser therapy for the treatment of ulcerated haemangiomas: a review of 78 patients. Br J Plast Surg. 2003;56(4):317-27.         

11. Deans RM, Harris GJ, Kivlin JD. Surgical dissection of capillary hemangiomas. An alternative to intralesional corticosteroids. Arch Ophthalmol. 1992; 110(12):1743-7.         

12. Fledelius HC, Illum N, Jensen H, Prause JU. Interferon-alfa treatment of facial infantile haemangiomas: with emphasis on the sight-threatening varieties. A clinical series. Acta Ophthalmol Scand. 2001;79(4):370-3.         

13. Tamayo L, Ortiz DM, Orozco-Covarrubias L, Durán-McKinster C, Mora MA, Avila E, et al. Therapeutic efficacy of interferon alfa-2b in infants with life-threatening giant hemangiomas. Arch Dermatol. 1997;133(12):1567-71. Comment in: Arch Dermatol. 1997;133(12):1593-5. Arch Dermatol. 1998; 134(10):1297-8.         

14. Grimal I, Duveau E, Enjolras O, Verret JL, Giniès JL. [Effectiveness and dangers of interferon-alpha in the treatment of severe hemangiomas in infants]. Arch Pediatr. 2000;7(2):163-7. French.         

 

 

Endereço para correspondência:
Nilson Lopes da Fonseca Junior
Rua Pedro de Godói, 269 - Apto. 153 - Bloco D
São Paulo (SP) CEP 03138-010
E-mail: [email protected]

Recebida para publicação em 17.06.2007
Última versão recebida em 05.09.2007
Aprovação em 14.09.2007

 

 

Trabalho realizado na Disciplina de Oftalmologia da Faculdade de Medicina do ABC - FMABC - Santo André (SP) - Brasil.


Dimension

© 2024 - All rights reserved - Conselho Brasileiro de Oftalmologia